Vigilância Ambiental Integralizada: a experiência do município de Campinas

Autores: Carlos Eduardo Cantúsio Abrahão, Cassia Catarina Pereira, Diana Isaura Antonioli, Flavio Gordon, Ivanilda Mendes, Janete Navarro, Marcio Lobo.
Instituição: Secretaria de Saúde da Prefeitura Municipal de Campinas Estado de São Paulo, Brasil.
Endereço: Avenida Anchieta, n° 200 - 11° andar.
                  CEP 13.015-904 - Campinas, SP - Brasil
 

O objeto deste trabalho é divulgar uma síntese do modo de operar a vigilância ambiental num sistema municipal de saúde, instituído nacionalmente através do Sistema Único de Saúde (SUS).

O município de Campinas situa-se num patamar estratégico sob vários aspectos, foco de poderosos interesses econômicos e territoriais, com paradoxal processo de degradação de sua qualidade de vida, mediante a instalação das violências e diversas outras agressões sociais ambientais, concomitantes ao processo de desenvolvimento das últimas décadas, que no seu todo se apresentam como um enorme desafio para os gestores públicos e a sociedade.

Com pouco mais de um milhão de habitantes e taxa de crescimento populacional estabilizada, Campinas é o município sede de região metropolitana cuja contribuição para produto interno bruto situa-se entre as principais do país, destacando-a nos meios científicos e acadêmicos, no comércio e serviços, em âmbito nacional, latino americano e internacional. Neste momento (2005), por exemplo, são grandes os interesses e controvérsias com relação aos impactos sociais e ambientais de inusitada ampliação do aeroporto internacional local (Viracopos), para se constituir no principal aeroporto de transporte de cargas e passageiros do país. Quanto aos indicadores sociais e de desenvolvimento novamente aparecem disparidades entre alto índice de desenvolvimento humano e baixo de mortalidade infantil, com altos índices de violências e exclusão social (desemprego, sub-habitação). Para conhecer mais sobre Campinas encontra-se disponível nas referências o endereço eletrônico de seu portal na rede mundial de computadores.

A vigilância ambiental faz parte do SUS em Campinas, que se constitui em referência nacional e internacional no âmbito do processo da Reforma Sanitária, permanecendo até os dias de hoje como municipalidade formuladora de políticas públicas, destacando-se a saúde. Os princípios gerais que norteiam o funcionamento do sistema resumem-se na incorporação do princípio do SUS do comando único em cada esfera de governo (gestão plena municipal), na descentralização da gestão através dos cinco Distritos de Saúde (DSs), no território sob responsabilidade direta das 46 Unidades Básicas de Saúde (UBS), e no controle social através do Conselho Municipal (para todo o município) e dos Conselhos Locais de Saúde (para o território de cada uma das UBS).

Há uma coordenação central do Departamento de Saúde Coletiva através da Coordenadoria de Vigilância e Saúde Ambiental (CoViSA), que, incorporando a coordenação da vigilância epidemiológica, sanitária, ocupacional, ambiental e do controle de zoonoses, articula o sistema através da Coordenadorias Distritais de Vigilância em Saúde (ViSa), que por sua vez, além de agirem diretamente no território municipal, orientam os Núcleos de Saúde Coletiva em cada uma das UBS.

O Sub-sistema de Vigilância em Saúde é operado diretamente por cerca de 190 técnicos e administrativos, entre diversas categorias profissionais diretamente relacionadas à articulação local do controle epidemiológico, sanitário e ambiental, além de todos os demais servidores públicos lotados na Secretaria Municipal de Saúde, perfazendo um contingente de quase 4.000 agentes em toda ela. Nos DSs atuam os quadros mais especializados (técnicos e supervisores interdisciplinares), e nas UBS os agentes de controle ambiental inseridos no contexto do Programa de Saúde da Família (PSF).

Portanto, uma característica importante da organização das equipes em Campinas é a sua locação descentralizada, atuando em programas de origem vertical, de forma horizontal. O Centro de Controle de Zoonoses e o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador possuem equipes próprias que dão o apoio técnico e a prestação de serviços específicos que lhes cabem.

Território, uso e ocupação do solo e área de cobertura de CS são articulados pelas equipes de vigilância e núcleos de saúde coletiva, de forma que o PSF e a vigilância ambiental se entrelaçam na atuação concreta (por exemplo, controle ecossistêmico de dengue), sendo que a articulação setorial institucional (intra e inter) é facilitada mediante a atuação distrital e central. A coordenação central municipal da vigilância ambiental é feita através da Área de Saúde Ambiental da CoViSA, que facilita a articulação no SUS dos Centros de Vigilância Epidemiológica (CVE) e Sanitária (CVS) da esfera estadual, e a Coordenação Geral de Vigilância Ambiental em Saúde (CGVAM) do Ministério da Saúde.

O papel da comunidade nas ações de vigilância ambiental é também uma questão angular. Os agentes comunitários de saúde selecionados entre membros próximos ou provenientes das comunidades locais são uma diretriz presentemente adequada, que se complementa ao trabalho da logística gerencial, de mídia e comunicação social através de assessoria jornalística e de imprensa.

A detecção e a ação da saúde ambiental com a comunidade é de fato relevante para a eficácia das ações de controle, como claramente se observa no caso das atuais epidemias de dengue em grandes centros urbanos. Ou bem se mobiliza a comunidade e de fato se intervém na raiz do problema (ovos e criadouros), ou somente se o tangencia, à vezes o agravando (endemização da doença e intoxicação social ambiental com desenvolvimento de múltipla resistência do vetor aos inseticidas).

Na área ambiental os problemas do município hoje enfrentados pelas equipes do SUS Campinas são de variada magnitude e diferentes complexidades.

A vigilância da qualidade da água encontra-se pactuada na programação integrada do SUS, de forma a que os parâmetros definidos na norma são buscados pelas equipes distritais com a rotina de coleta e análises de amostras, tanto do sistema público como de fontes alternativas de abastecimento. As intervenções necessárias são realizadas mediante a análise de cada situação. Estão pactuadas 660 amostras/ano, sendo que há expectativa de ampliação do programa para vigilância e controle da exploração de águas subterrâneas, que segundo estimativas preliminares, perfazem entorno de 400 locais a serem cadastrados, regularizados e monitorados. Na consolidação e ampliação desse trabalho a articulação inter-institucional com o órgão municipal de saneamento (SANASA) mediante convênio que assegure o programa conjunto das equipes.

Em atividade conjunta com os Comitês (Estadual e Federal) de Bacia dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, os técnicos do SUS em Campinas integram grupo de trabalho com atividades de investigação, pesquisa e controle de antropo-zoonoses relacionadas a matas e remanescentes florestais, bem como às atividades de reflorestamento ciliar, integrado por instituições como os municípios das bacias, Superintendência de Controle de Endemias, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB), universidades, abordando doenças como a febre maculosa, raiva, leishmaniose, hantavirose, entre outras emergentes.

Campinas retrata uma realidade global, com a emergência de novos setores industriais, com tecnologia mais avançada, e o declínio de outros. Esse declínio provocou o sucateamento, desativação, transferência e muitas vezes o abandono de plantas industriais que representam, em geral, passivos ambientais, isto é, áreas em processo de contaminação (indústrias ainda em funcionamento), ou já contaminadas (empresas desativadas ou áreas de descarte). As equipes de vigilância ambiental contabilizaram até o presente momento 59 áreas contaminadas sujeitas à vigilância e controle quanto aos riscos sanitários, ocupacionais e ambientais de tais localidades, 35 das quais cadastradas oficialmente pelo órgão estadual de controle ambiental (CETESB) e as demais classificadas como suspeitas e indicativas de investigação. Espera-se que este número deva aumentar, na medida em que sejam identificadas novas áreas, significando um problema ambiental e de saúde pública dos mais sérios a ser enfrentado. Dentre essas áreas podem enunciar-se casos em postos de combustíveis, áreas de deposição irregular de resíduos, plantas industrias desativadas e em atividade, áreas urbanas contíguas a rurais com atividade agrícola e intenso uso de agrotóxicos. A intervenção no problema demanda diagnóstico e ação dirigida a cada caso, no mais das vezes mediante ações judiciais e poder de polícia administrativa.

A gestão de resíduos urbanos tem tido a participação dos agentes de saúde no município, a partir dos programas de controle de dengue e da leptospirose, do manejo de resíduos de serviços de saúde e do descontrole de áreas de deposição irregular em solo. Vez por outra as equipes são acionadas para atendimento emergencial a descarte criminoso de resíduos em áreas públicas, demandando providências emergenciais e mediatas, na perspectiva de correção e prevenção desses eventos. A geração diária de resíduos domésticos urbanos varia em torno de 0,7 a 1 kg/habitante/dia, e de resíduos da construção civil, em torno de 3 kg/habitante/dia. As equipes de saúde coletiva têm desempenhado decisivo papel de contribuição para o saneamento ambiental referente ao tema, bem como fomento a soluções social e ambientalmente mais adequadas no controle da disposição irregular em solo, incentivando o funcionamento de cooperativas de triagem e separação de materiais recicláveis. O manejo dos resíduos de serviços de saúde está sendo buscado, tanto nos serviços próprios como no setor regulado, adequando-os às normas sanitária e ambientais recém editadas em vigor (RDC 306/04 da ANVISA e Resolução 358/05 do CONAMA).

As políticas de controle da qualidade do ar demandam em Campinas maior desenvoltura, com o agravamento de sua qualidade, o que se denota particularmente nos períodos de estiagem prolongada e inversões térmicas. Campinas possui uma frota de mais de 500.000 veículos em circulação, atingindo índice inusitado de número de veículos por habitante (um veículo para cada dois habitantes). As fontes fixas e pontuais também merecem abordagem diferenciada, ainda que o órgão de controle ambiental mantenha programa específico de fiscalização e controle institucional. Vêm sendo capacitados os agentes de diversos segmentos relacionados a um potencial programa de controle através dos cursos à distância ministrados pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Banco Mundial, e o que se planeja é intervenção articulada por parte dos entes governamentais no município e região metropolitana.

A poluição eletromagnética originada do funcionamento de sistemas de rádio e telecomunicação sem fio é objeto de preocupação crescente em diversas localidades do planeta, e tem recebido tratamento diferenciado em Campinas, a partir de pioneira legislação municipal que disciplina a matéria, particularmente a partir da expansão dos sistemas de telefonia móvel. A citada legislação está em processo de implantação, sendo que há no presente momento indicação técnica de amplo diagnóstico em campo dos níveis de radiação não ionizante no território do município, com destaque para locais críticos e áreas sensíveis, num total de 200 Estações Rádio-Base de telefonia celular e mais 30 fontes de operadoras de rádio e televisão.

A ordem constitucional brasileira e seus reflexos na organização municipal acrescentaram ao tradicional conceito da democracia representativa (indireta, através do sufrágio universal), o de democracia participativa (representação direta), exatamente o que se objetiva através de conselhos municipais que se concentram em eixos temáticos facilitadores da governança local. Dessa forma, uma prioridade que vem sendo recomendada e cumprida ao longo dos anos, é a representação da área ambiental local do SUS no Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), através dos conselheiros da Secretaria Municipal de Saúde no Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMDEMA) do município, órgão colegiado de acompanhamento, fiscalização e controle das políticas ambientais locais. Vários temas de interesse ambiental local têm sido pauta do COMDEMA, entre os quais se destaca o controle da expansão urbana e a necessidade de estudos de impacto ambiental prévios a empreendimentos.

O intercâmbio entre os órgãos oficiais de aconselhamento a governança auxilia, enriquecendo o processo de governar, nas questões da mulher ou do idoso, tutelar da infância e juventude, de educação, saúde e meio ambiente, de gestão de áreas de proteção ambiental, de desenvolvimento urbano e defesa do patrimônio histórico e cultural, de transportes, etc. Os conselhos podem atuar analisando e manifestando pareceres e considerações sobre projetos e projetos de lei, ou decretos e empreendimentos, colaborando no elenco de atividades prioritárias e influenciando as políticas públicas, que passam a ser pactuadas com a sociedade. Para tanto são imprescindíveis sua legitimidade e legalidade, bem como a publicidade e transparência, de todo esse processo.

Para conhecer mais sobre a atuação da Secretaria Municipal de Saúde de Campinas acesse o endereço eletrônico do seu portal na rede mundial de computadores, disponível nas referências.

Temáticas abrangidas neste trabalho: saúde ambiental, qualidade de vida, riscos ambientais, ambiente e saúde, resíduos sólidos, líquidos e perigosos, vigilância ambiental, atenção primária ambiental, qualidade do ar, riscos ocupacionais, urbanização, contaminação ambiental, radiações não ionizantes.

Referências na Internet: