A Sujeira e o Tapete

Artigo publicado no portal da Prefeitura Municipal de Campínas na semana de 28/out a 04/nov de 2002, disponível na página da Secretaria de Saúde daquela prefeitura.
 

Está difícil sair da Câmara dos Deputados o projeto substitutivo da Política Nacional de Resíduos, ainda que seu relator e outros deputados tenham se empenhado bastante na tarefa de negociar com os setores envolvidos, em várias audiências públicas, a manutenção de princípios fundamentais de sustentabilidade ambiental. Poderosos interesses antagonizaram-se aos princípios do "poluidor-pagador" e ao da responsabilização da cadeia produtiva com o ciclo "do berço ao túmulo" de produtos, mercadorias e embalagens, de forma que sua tramitação ficou para a próxima legislatura.

A prática de se esconder "sujeiras" do desenvolvimento "embaixo do tapete" compromete gerações atuais e futuras. A ordem nacional e internacional constrangeu indústrias e órgãos de controle ambiental a fazerem denúncias de contaminação que escandalizam: a estimativa é de 4 a 6.000 áreas contaminados com resíduos tóxicos e perigosos em nosso país, 255 oficialmente identificadas só no Estado de São Paulo, comprometendo de forma muito grave o ambiente, e colocando em risco a saúde das pessoas. Grotesca evidência de industrialização e desenvolvimento insustentáveis que deveriam jamais prosperar. Para tanta sujeira acumulada o tapete ficou curto.

Na região metropolitana de Campinas temos sítios identificados como contaminados, entre eles agora adquirindo tardia visibilidade o Mansões Santo Antônio no município sede. Atônitos, moradores e empreendedores imobiliários vêm argüir os técnicos de meio ambiente e saúde pública dos reais riscos de curto e longo prazo, e uns e outros acabam por demarcar de forma artificial territórios de competências onde os de meio ambiente não entenderiam de medicina e epidemiologia, e os de saúde seriam analfabetos em engenharia ambiental. Nada disso: o que a população espera é o decisivo controle do mal.

No caso Mansões Santo Antônio evidencia-se grave passivo ambiental com confirmação da presença de resíduos tóxicos industriais que jamais poderiam ter ido ao solo, sub-solo e água, que merece agora a competente intervenção. Persistem as perguntas acerca dos eventuais danos a que moradores e trabalhadores estiveram sujeitos por terem se exposto a substâncias altamente tóxicas, e das responsabilidades, custos sociais e ambientais de tudo isso. Interessa agora dimensionar os eventuais danos, mas principalmente que as medidas remediadoras não tardem e não economizem recursos tecnológicos e econômicos para uma solução que não seja colocar outro tapete em cima da sujeira.

Quanto mais se observa atentamente o que ocorreu, maiores os sobressaltos pelos inusitados desdobramentos, e maior a indignação que se nos acomete, porque chegou até a haver liminar judicial que permitiu o insustentável funcionamento da indústria por anos a fio! Com todo o respeito à emérita decisão, hoje, a quem recorrer? Que sirva o mau exemplo para que ele jamais se repita. O Conselho de Meio Ambiente de Campinas estará atento às medidas a serem tomadas em todos esses sítios contaminados, para se reverter a não sustentabilidade, e para que o desenvolvimento não agrida a saúde das pessoas e do ambiente em que vivem.