Ampliação de Viracopos e globalização
Artigo originalmente enviado ao Jornal "Correio Popular" em 26/11/2001, não publicado. |
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Está demarcado na história e no brasão de Campinas: tal qual a fênix que a simboliza, ressurgirá das cinzas. E que formato adquirirá essa “ressurreição” do genocídio que nos assola numa maldição de transição de século? Que fatores determinam a bestialidade urbana em que nos metemos, e como faremos para nos safar dela? Como tentar recuperar e preservar o tênue fio condutor rumo a um futuro de resgate de qualidade de vida e do ambiente que nos sustenta?
Continuará a depender em parte das decisões que tomarmos hoje. Viracopos não é fênix mas é mitológico: vai ressurgir para alavancar desenvolvimento. Apesar do terrorismo, a aviação comercial permanecerá, acreditam, porque o mundo “civilizado” vai se impor à barbárie, ainda que produzindo e distribuindo armas mais destrutivas e cruéis.
De fato evoluimos pouco, se é que evoluímos: a grande diferença com o homem das cavernas é que agora as armas do homem do século XXI podem destruir a tudo e a todos. Do lado de cá, a pujança e o explendor da “princesa globalizada d’oeste” convivem também com a ameaça, com a dor e o sangue da violência, um “glamour” de contradição.
Campinas: não importa que a matem, e matem a seus pais, desde que siga sôfrega na saga “desenvolvimentista”, ainda que suicida; a prefeita quer ampliar a discussão, então que se destitua a prefeita também, para ela não atrapalhar as negociações! Não preveja e não previna impacto social e ambiental, porque os seus interesses não estão aqui. Não há porque mitigá-los porque vamos pelo caminho da repressão policial armada contra o caos social da inveja odiosa, agravada por desemprego estrutural e pela banalização da vida. É assim que se tem feito até aqui.
Mas Campinas reagirá! Sobre os rumos de desenvolvimento que uma cidade quer para seus filhos, a decisão a prevalecer não pode mais ser somente a de macro interesses econômicos, capitaneados pela mídia, e decididos unilateralmente pelos governos. Uma decisão desse porte, numa sociedade realmente civilizada e democrática, tem que passar pela discussão e pactuação com a sociedade. Era o que Toninho do PT muito provavelmente começou a fazer e o que queremos, e que portanto, vamos continuar.
A decisão sobre Viracopos ou quaisquer outros empreendimentos não pode mais ser rumo ao caos urbano, social e ambiental do nosso pior exemplo, o da capital paulistana. Alagamentos e enchentes em floras devastadas, ocupações interesseiras e criminosas de áreas de preservação ambiental, fluxo esgotado de pessoas e cargas com o agravamento da poluição atmosférica e desperdício de energia (combustíveis fósseis) nos crescentes congestionamentos de veículos, agressões químicas com desequilíbrios e escassez de águas superficiais e profundas, contaminação de solo (e água) com resíduos perigosos, esgotamento de áreas para deposição de resíduos, acidentes e violências que se banalizam.
Em 27 de novembro de 2001 o novo Conselho Municipal de Meio Ambiente de Campinas reuniu-se para iniciar e colaborar na discussão sobre a ampliação de Viracopos. Acredito que os conselheiros não estão com a pretensão de que o COMDEMA seja o único a definir uma posição, ou que estariam fechados para o diálogo, mas tenho absoluta certeza que todos querem ajudar a decidir o melhor para a cidade, para a região, para o Estado e o País. Decidir agora com critérios de cuidado e preservação, não para “engessar” o desenvolvimento, mas disciplinar, aqui e agora, uma globalização que não seja traiçoeira.
Esperamos que os órgãos licenciadores de São Paulo passem a respeitar a comunidade organizada, ouvindo-a antes de sair dispensando a necessidade de estudos e mitigação de impactos sociais e ambientais de grandes empreendimentos, como é o caso de Viracopos, e como veio fazendo nos últimos anos. Tudo bem que seja estratégica essa ampliação, mas vamos olhar com competência, para além da tolice imediatista, com vistas a sustentabilidade ambiental, além da econômica, à qualidade e preservação da vida.
P.S. Em 18 de dezembro de 2001, o COMDEMA aprovou a Deliberação 01/01, que foi publicada no Diário Oficial do Município de Campinas nos dias 22/12 (à página 21), 27/12 (à página 20), 28/12 (à página 12).